Um dia, a Verdade resolveu visitar um grande palácio.
Envoltas as lindas formas num véu claro e transparente, foi ela bater à porta do rico palácio em que vivia o glorioso senhor das terras muçulmanas. Ao ver aquela formosa mulher, quase nua, o chefe dos guardas perguntou-lhe:
- Quem és?
- Sou a Verdade! - respondeu ela, com voz firme. - Quero falar ao vosso amo e senhor.
O chefe dos guardas, zeloso da segurança do palácio, apressou-se em levar a nova ao grão-vizir:
- Senhor - disse, inclinando-se humilde -, uma mulher desconhecida, quase nua, quer falar ao nosso soberano.
- Como se chama?
- Chama-se a Verdade!
- A Verdade! - exclamou o grão-vizir, subitamente assaltado de grande espanto. - A Verdade quer penetrar neste palácio! Não! Nunca! Que seria de mim, que seria de todos nós, se a Verdade aqui entrasse? A perdição, a desgraça nossa! Diz-lhe que uma mulher nua não entra aqui!
Voltou o chefe dos guardas com o recado do grão-vizir e disse à Verdade:
- Não podes entrar, minha filha. A tua nudez iria ofender o nosso califa.
Vendo que não conseguiria realizar o seu intento, ficou muito triste a Verdade, e afastou-se lentamente do grande palácio, cujas portas se fecharam à diáfana formosura!
Mas…
a Verdade entrou-se do vivo desejo de visitar um grande palácio.
Vestiu-se com riquíssimos trajes, cobriu-se com jóias e adornos, envolveu o rosto em um manto diáfano de seda e foi bater à porta do palácio em que vivia o glorioso senhor dos Árabes.
Ao ver aquela encantadora mulher, linda como a quarta lua do mês de Ramadã, o chefe dos guardas perguntou-lhe:
- Quem és?
- Sou a Fábula – respondeu ela, em tom meigo e mavioso. – Quero falar ao vosso amo e senhor.
O chefe dos guardas, zeloso da segurança do palácio, correu, radiante, a falar com o grão-vizir.
- Senhor – disse, inclinando-se, humilde -, uma linda e encantadora mulher, vestida como uma princesa, solicita audiência de nosso amo e senhor.
- Como se chama?
- Se chama Fábula!
- A Fábula! – exclamou o grão-vizir, cheio de alegria. – A Fábula quer entrar neste palácio! Allah seja louvado! Que entre! Bem-vinda seja a encantadora Fábula. Cem formosas escravas irão recebê-la com flores e perfumes. Quero que a Fábula tenha, neste palácio, o acolhimento digno de uma verdadeira rainha!
E abertas de par em par as portas do grande palácio de Bagdá, a formosa peregrina entrou.
E foi assim, sob o aspecto da Fábula, que a Verdade conseguiu aparecer ao poderoso califa de Bagdá, o sultão Harum Al-Raschid, Vigário de Allah e senhor do grande império muçulmano.
Lenda árabe
recontada por Malba Tahan
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